MEMÓRIA JUSTIFICATIVA

1. Objectivos sumários

Este projecto tem objectivos simples, mas cuja importância e impacto pretendem ser relevantes para o futuro.

Recolher (enquanto é possível) memórias pessoais e físicas dos sistemas de informação da Região Norte, usar isso para prototipar um espaço de animação cultural ao serviço da comunidade e preservar e dessiminar o conhecimento e os materiais recolhidos através de uma iniciativa com impacto.

2. Porquê?

A industria das tecnologias e dos sistemas de informação á algo recente. Nascida no pós-guerra, desenvolveu-se de um sector económico marginal (mas de tecnologia de ponta) num sector central para o desenvolvimento das economias modernas, e tão mais critica quanto mais desenvolvida for essa economia. Tudo isso em 50 anos.

É por isso um caso absolutamente excepcional: uma industria que atinge a maturidade numa geração. Em que a obsolescência tecnológica se mede em cinco ou dez anos. Em que nesses cinquenta anos se desenvolveram gerações diferentes de tecnologias e se passou de algo esotérico e excêntrico para tecnologias ubíquas e pervasivas.

O que também significa que muitos dos percursores e dos protagonistas da instalação e do desenvolvimento das tecnologias e sistemas de informação na Região Norte estão ainda vivos.

A recolha dos seus testemunhos e das suas memórias é bem reconhecida como uma oportunidade única de obter informações e materiais cuja importância quer para a história económica das regiões, como para a história da tecnologia, quer para a história empresarial, terão no futuro um valor indiscutível.

O recurso a meios modernos do audiovisual e do multimédia apenas torna essa oportunidade ainda mais fácil e de preservação e acesso mais atractivos.

Para além desses testemunhos humanos, de técnicos, operadores, empresários (quer fornecedores de produtos e serviços, quer utilizadores), universitários, há ainda em muitos casos a possibilidade de recolher e preservar equipamentos agora obsoletos, mas que estiveram ligados a essas histórias, a essas personagens e a essas instituições. A conjugação dos testemunhos dos actores e protagonistas com algum do material associado representa uma oportunidade interessante de reconstituir parte da memória colectiva da Região quanto ao processamento de dados e ao calculo científico.

E note-se que a Região Norte foi nesse sentido mais importante do que muitas vezes se admite. Muitas das grandes instalações e projectos iniciais foram iniciados e implementados em Lisboa. Mas com muito know-how e gente do Norte. E muitos projectos instalados no Norte tiveram grande impacto a nível da administração e empresas públicas, assim como a nível empresarial.

São pedaços dessa memória colectiva regional que se pretendem recolher, num momento em que essa oportunidade rapidamente se esgotará, pelo menos no que diz respeito aos primeiros percursores e protagonistas. O ciclo infernal da vida não perdoa. Muitos dessas pessoas estão hoje nos seus 70 e 80 anos. Alguns já faleceram mesmo (por exemplo, o Professor Rogério Nunes, da Faculdade de Ciências, de quem – que seja do nosso conhecimento – não ficou qualquer registo historiográfico ou testemunhal de alguém que foi o responsável pelo LACA – Laboratoriode Calculo Automático). Este projecto pretende aproveitar uma janela de oportunidade que ainda existe, mas que infelizmente se irá ineluctavelmente fechando nos anos mais próximos.

O interesse internacional pelo tema é bem patente nas importantes publicações que recentemente tem vindo a lume sobre esta temática, a nível internacional (ver bibliografia). Na Europa tem sido feito um esforço muito especial para recuperar e redescobrir o papel relevante que a tecnologia europeia teve no nascer e desabrochar desta industria das tecnologias e sistemas de informação, e na descoberta do seu uso intensivo em aplicações de processamento de dados empresariais. Este projecto pretende ser um contributo regional para esse movimento de ideias e esforços.

3. Como?

Assim o projecto estrutura-se ao longo de três grandes ideias, a que correspondem as três acções do projecto:

No desenho do projecto procurou-se conjugar a recolha dos testemunhos e materiais (cuja importância por si só cremos bem que justificaria o projecto) com um esforço de tornar esses materiais rapidamente acessíveis à comunidade e em especial em usá-los como motivação para a aprendizagem das tecnologias da informação em escolas de vários níveis, desde o secundário ao superior.

Isso sem prejuízo do público em geral: julga-se que um espaço, mesmo singelo, experimental e limitado como o que será possível no âmbito de um projecto desta dimensão, terá capacidade para atrair vastas camadas da população que de alguma forma se sinta interpelada ou interessada pelo espantoso desenvolvimento das tecnologias da informação nas últimas décadas. Experiências alheias mostram que iniciativas deste tipo pode ter um importante poder atractor.

Nesse sentido pode constituir um inicio de pólo atractor para o projecto de renovação da Fábrica do Teles em Santo Tirso.

4. Também um contributo para motivar vocações tecnológicas indispensáveis à industria do conhecimento no Minho

A importância de iniciativas deste tipo (espaços de animação cultural) para a motivação de vocações para as áreas tecnológicas é um aspecto lateral do projecto, mas que deve ser tido em consideração importante no contexto do reforço da implementação das industrias das tecnologias e sistemas de informação (TSI) na Região Norte, e muito especialmente no Minho.

Por outro lado a industria dos TSI, nuclear no contexto dos desenvolvimentos da dita “nova economia”, debate-se com um problema bem conhecido de falta de mão de obra qualificada. Embora não se trate de um problema especificamente português, constitui um desafio às regiões europeias. Paradoxalmente, e apesar de uma procura garantida e de níveis remuneratórios acima da média, as instituições de ensino (superior e outras) debatem-se com algumas dificuldades em recrutar candidatos para os cursos oferecidos, quer em quantidade (apenas 70% das vagas oferecidas em 1999 pelo ensino superior público foram preenchidas), quer especialmente em qualidade.

Estudos recentes (feitos pelo Departamento de Sistemas de Informação da U. Minho) referenciaram o problema e a sua importância para o futuro do sector em Portugal e identificaram a necessidade urgente de acções que despertem vocações profissionais para o sector, o credibilizem sob o ponto de vista sócio-profissional e que atraiam alunos qualificados para os cursos TSI. Acções junto da comunidade escolar são para isso fundamentais.

Este projecto pode dar um contributo para atingir esses objectivos através de um programa de animação cultural e técnica em torno de um espaço a criar que reúna peças e materiais documentais da memória TSI. Pretende-se testar e prototipar o conceito. O seu sucesso poderá levar no futuro, e noutro projecto subsequente, à sua extensão na forma de rede regional.

5. Metodologias concretas

É claro que o esforço inicial terá que ser de identificar um conjunto de 15 casos (pessoas, instituições, protagonistas) sobre os quais se centre o projecto.

Os testemunhos de cada caso serão registados em áudio e vídeo digital, e consequentemente editados (embora com o especial cuidado de preservar a atmosfera e o ritmo de discurso do entrevistado). Para além da edição digital áudio e vídeo, os testemunhos serão transcritos, editados e revistos seguindo as metodologias de análise qualitativa típica das ciências sociais e históricas.

Logo teremos no final uma colecção de 15 vídeos, com transcrição editada associada e alguns apontamentos biográficos de enquadramento. Um vídeo sumário e final do projecto será feito para fins de apresentação.

Para além de brochuras de apoio, descritivas do projecto e dos elementos do espaço de animação cultural (inclusivé para apoio às visitas), pretende-se promover um seminário final de apresentação dos resultados do projecto e que simultaneamente reúna técnicos, animadores, historiadores e universitários interessados na temática da história empresarial, tecnológica e social das tecnologias da informação. Será uma primeira reunião especializada a promover em Portugal sobre este tema, procurando assim reforçar uma vez mais a capacidade da Região do Minho em intervir no panorama nacional dos TSI. As comunicações dessa reunião, assim como os materiais escritos (transcrições dos testemunhos) e gráficos (imagens dos materiais coleccionados) do projecto serão objecto de publicação em livro – que será pioneiro em Portugal.

No livro serão ainda incluídas as conclusões do programa desenvolvido à volta do protótipo de espaço de animação criado e das actividades e visitas associadas, procurando daí tirar ensinamentos sobre a replicação e extensão futura do conceito e formulando recomendações para tal.

A Universidade do Minho disponibiliza-se desde já para albergar no seu Museu Virtual de Informática todos os materiais do projecto – disponibilizando aí as transcrições dos testemunhos recolhidos e imagens dos materiais coleccionados, assim como informação pertinente técnica associada. Ao albergar nesse site um espaço relativo a este projecto, a Universidade do Minho dá um importante contributo para o projecto e permite manter os seus custos a um nível muito reduzido. O espaço relativo aos materiais e testemunhos das colecções do projecto será integrado no referido site, mas permitirá também o seu acesso independente e directo através de um portal específico.

Note-se que o referido Museu Virtual de Informática é o principal site português dedicado ao assunto e é reconhecido internacionalmente como relevante, sendo citado e linkado em praticamente todos os grandes sites internacionais relativos a esta temática. O endereço do Museu Virtual referido (mantido pelo Professor Fernandes de Almeida) é http://piano.dsi.uminho.pt/museuv e regista um significativo volume de acessos internacionais, em especial de países de língua portuguesa (mas não só).

A procura e identificação de materiais a recolher para a colecção será feita por diversas vias de sensibilização de pessoas e empresas, dentro das limitações de meios impostas pelo projecto. Algumas das acções previstas com esse objectivo são:

A identificação das pessoas a entrevistar para a colecção de testemunhos será feita com base nas sugestões e propostas feitas por especialistas do sector, cujo contacto é do conhecimento do Departamento de Sistemas de Informação da Universidade do Minho, e que apoiará o projecto na identificação desses protagonistas. Também o conhecimento pessoal do director executivo indigitado para o projecto contribuirá para esse processo de identificação e selecção de testemunhos relevantes.

O projecto terá uma imagem gráfica coerente, dinâmica, atractiva e moderna que seja usada de forma coerente e sistemática nos vários materiais documentais previstos.

No projecto não está prevista verba para a divulgação apoiada de cópias dos testemunhos gravados. No entanto essa distribuição será facilitada e incentivada, embora numa base de cobertura dos custos directos envolvidos pelo processo de cópia, reprodução e expedição.

6. Um projecto de recolha de “património cultural regional imaterial”, não um projecto de investigação

O objectivo deste projecto não pode de forma alguma ser confundido com um projecto de investigação científica. Nenhuma actividade proposta neste projecto se pode considerar como tal, embora os materiais recolhidos possam vir a viabilizar e catalizar uma importante série de estudos científicos sobre história económica, historia empresarial, histórica da tecnologia e sobre a história do desenvolvimento regional, cujo interesse para a compreensão dos fenómenos de inovação tecnológica e do desenvolvimento regional são óbvios.

Os resultados do projecto ajudarão uma vez mais a projectar a Região do Minho como protagonista relevante do sector TSI português. Nesse sentido este projecto tem também uma marca de marketing territorial regional.

7. Referências e bibliografia

O prestigiado IEEE History Center apresenta uma importante colecção de testemunhos do tipo alvo deste projecto no seu site, acedível em www.ieee.org/organizations/history_centre/oral_histories_menu.html.
As considerações metodológicas do History Center são relevantes.
Cita-se a seguinte passagem:

You might be wondering why we call these documents "oral histories" rather than "interviews." An interview is a finished product that you might see in the newspaper, on TV, or in some other medium. It is meant to convey particular information.

An oral history, on the other hand, is considered by historians to be a "primary source," raw data from which they will, in combination with other raw data, create historical narratives. Although a historian might also use a magazine interview or a videotaped speech as a primary source, an oral history is a document created by themselves or another historian through the informal recording of a dialogue between interviewer and interviewee. Although edited by the interviewer for flow and consistency, and by the interviewee to confirm that his or her words have been appropriately captured, an oral history transcript is relatively unedited when compared to other forms of interview.

The IEEE History Centre is determined to preserve as source material for the future historians of technology the personal memories of pioneering electrical and computer engineers, the technologists who transformed the world in the 20th century. When we first began collecting these interviews, we assumed that the only people who would see the results would be professional historians. With the advent of the Web, text recognition, and related technologies, it is suddenly possible for us to make these wonderful documents available to anyone, any time.

But as a result, there may be a misunderstanding about what these are. Since they are minimally edited, they may not "read" like other interviews you have seen. They may seem disorganized, reflecting the differences between a conversation and a printed story. Statements made by interviewees have not been checked for accuracy. We hope you will enjoy and find useful the stories of these fascinating men and women, but please take this disclaimer into account as you make use of them.

Finally, please note that the IEEE History Centre holds the rights to these documents. We encourage use by historians, teachers, and others within the accepted United States standards of Fair Use. For any other use, you must first obtain our express written permission: history@ieee.org



Ver também o importante Charles Babbage Institute – Center for the history of information processing, mantido pela Universidade de Minnesota em www.cbi.umn.edu/tc.html. Na CBI Software History Bibliography são mantidas “oral histories” de quase 400 protagonistas da história do TSI americano.

O Software History Center mantém uma colecção semelhante apenas relativa à industria de software.

Outro exemplo: a Computer Conservation Society (inglesa) mantém uma colecção semelhante de protagonistas da industria britânica (ver www.cs.man.ac.uk/CCS/ccs_arch.htm).

Para mais informações acerca do tema na web, ver links em The Virtual Museum of Computing.

Algumas importantes publicações recentes sobre o tema, que usam intensamente a recolha de testemunhos de protagonistas da industria:
  • D. Caminer et al, “LEO – the incredible story of the world’s first business computer”, McGraw-Hill, 1998

  • P. Freiberger e M Swaine, “Fire in the valley – the making of the personal computer (2nd ed.)”, McGraw-Hill, 2000

  • Martin Campbell-Kelly, “ICL, a business and technical history”

  • Martin Campbell-Kelly e W Aspray, “Computer- a history of the information machine”, Basic Books, 1996

  • R. Pool, “Beyond engineering – how society shapes technology”, Oxford University Press, 1997

  • D. C Mowery e N Rosenberg, “Paths of Innovation – technological change in 20th century America”, Cambridge University Press, 1999

  • D Mowry e R Nelson, “Sources of industrial leadership – studies of seven industries”, Cambridge University Press, 1999 (cap. 3 e 4)

  • S. Star (eds.), “The cultures of computing”, Blackwell Publishers, 1996
Esta lista (não exaustiva, longe disso) não pode no entanto deixar de citar dois clássicos fundamentais do género: